segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

All alone I fall to pieces



Preguiçosamente finalmente sai da cama, mexi o pescoço preguiçosamente, focando na cortina, não queria pensar, não queria pensar nunca mais, se fosse possível. Pensar me trazia as reviravoltas e aquilo me dava enjoo. Algumas coisas simplesmente podiam ter o poder de desaparecer, sem que se fizesse força. Chacoalhei a cabeça e fui dando um passo atrás do outro, meus passos eternos em direção ao abismo, o abismo que a garota boba busca para si inconscientemente. A porta do quarto revelava a escuridão do corredor e uma luz piscava no fim dele, a música ficava mais alta e luz aumentava, na mesma proporção que a voz dele ficava mais alta, mais clara. Os passos se apressaram e a música agora tinha um tom de melancolia, havia dor em cada palavra, aquilo me pegou e por uns instantes fechei os olhos e me permiti pensar. Tudo veio como um tapa na cara, era como se os cacos caíssem todos em minha cabeça, os cacos dos amores, os cacos dos sonhos quebrados, os pedaços mínimos de partes minhas que jamais voltariam. Era impressionante observar que tudo podia fica tão pequeno, que aos olhos de quem está de fora, são só os caquinhos de um cristal insignificante.
Ali parada os cortes inexistentes ardiam e era como se eu conseguisse os sentir sangrar, arder e cicatrizar, tornando a pele um emaranhado de cortes desordenados, mas cheios de história. Alguém disse que nossas cicatrizes contam nossas histórias e no fim, elas contam mesmo, para aquele que pergunta 'O que houve em seu dedo?' e a pessoa responde 'Ah, cortei com uam faca sem querer quando eu tinha 10 anos e ficou assim', ai está uma história simples sobre uma cicatriz, mas como se faz quando elas não podem ser vistas ou sentidas? Sim, aquelas que ardem ao vislumbrar o motivo que as fizeram ser criadas, aquelas que só você toca e que vê por toda parte e nada fará com que ela suma. Não tem plástica que cure a dor da alma e a minha ardia há tempos, a minha se despedaçava e com muito custo juntava cacos, sem conseguir montá-la por inteiro, até que algo ou alguém a chutasse de novo e os cacos voltassem para o chão. O coração se contraiu num espasmo de proteção, ele tentava se proteger do emaranhado de sensações que apenas o fato de pensar trazia. Os olhos tentaram reagir, de alguma forma, já secos e exaustos, eles não tinham mais tanto pra externar, apesar da tentativa.
A cabeça bateu na parede e o corpo deslizou por ela, dando alguns passos em direção a sala. A voz que cantava agora era outra, a música era triste, mas não tinha a mesma emoção do meu companheiro de sempre, os lábios se mexeram sem fazer som, a melodia era cantarolada pelos lábios silenciosos, enquanto a cabeça continuava trabalhando sem parar. "Won't you drive away? 'Cause I'm no good for you, there's no place in this place that was built for you" Os braços se encolheram a medida que ia me sentindo mais só em meio aos pensamentos, em alguns instantes lembrei de Bella e seu sofrimento silencioso, os sonhos, a solidão constante, no fim ela devia satirizar a vida real e ela devia vir tirar sarro do sofrimento de fato, ou apenas mostrar que é real e que é passível de acontecer por ai. Eu estava sozinha, era a verdade.
O sofá parecia tão distante e a música mudara mais uma vez, a tv ligada mostrava aqueles grandes olhos na tela, ele lutava com suas emoções para cantar ali. A câmera pegava toda e qualquer nuance de emoção que passava por ele. A melodia era triste, o tom era suave, era fácil saber como as pessoas caiam em lágrimas ao escutarem. Meus olhos ainda pareciam impassíveis, mesmo olhando-o ali, os pés inconscientemente me arrastaram para perto do sofá e ali sentei. Os cotovelos tocaram os joelhos e as mãos apoiaram a cabeça, os olhos não se mexiam, estavam fixos nos olhos brilhantes dele, os olhos que se controlavam para não chorar no meio da multidão. A voz estava mais rouca que o normal, o arranjo parecia mais calmo que o convencional, até ele explodir em bateria e guitarra. A boca cantava e mesmo assim a voz ainda não saía. "When all you know seems so far away and everything is temporary, rest your head, I'm permanent" Os olhos na tv queriam chorar e logo se marejam e em algum milagre, os meus fazem o mesmo. Havia dor nele, havia muito mais ali do que as câmeras poderiam mostrar. "I know he's living in hell every single day and so I ask: Oh God is there some way for me to take his place? And when they say it's so touch and go, I wish I could make it go away, but still you say" As escassas lágrimas rolavam pela face enquanto já pedia desculpa a mim mesma por ter deixado que elas caíssem. Os lábios ressecados são mordiscados por uns instantes, enquanto mais flashs passavam e diante dos meus olhos via que havia quebrado todas as promessas que fiz a mim mesma.
Prometi me fechar num casulo e não deixar que nada ou ninguém entrasse. Prometi ser forte. Prometi não me abalar com a falta de cuidado das pessoas, apenas achar normal. Prometi me cuidar acima de tudo. E no fim, apenas prometi e descumpri tudo e por algum motivo evidente, não me sentia melhor. Os cacos imaginários continuavam batendo no chão e a respiração mais uma vez se tornou profunda. Não havia mais o que pensar, estar ali sozinha no escuro mais uma vez me quebrava por dentro e não podia reclamar, meus caminhos me levaram pra onde estou.
Os passos me levariam ao abismo de fato, minhas escolhas simplesmente seriam a estrada e um dia ficaria cara a cara com o tal abismo e abriria os braços e simplesmente me deixaria voar por alguns instantes. A cabeça ficaria vazia por alguns instantes, como se fosse um pássaro com uma asa quebrada, caindo e caindo.
Chacoalhei a cabeça novamente e voltei a olhar a noite que já virava dia em minha janela. Lá vinha mais um dia, mais um dia. "This is temporary sanity, an exercise in vanity, so long to the ordinary day. Wrought with fictitious tales of how there’s any other way, hold on to anything at all"
Era só mais um dia ordinário e comum, não havia com o que me preocupar, era só dia.